Denomina-se cultura afro-brasileira o
conjunto de manifestações culturais do Brasil que sofreram
algum grau de influência da cultura
africana desde os tempos do Brasil
colônia até a atualidade. A cultura da África chegou ao Brasil, em sua
maior parte, trazida pelos escravos negros na época do tráfico transatlântico de escravos.
No Brasil a cultura africana sofreu também a influência das culturas europeia
(principalmente portuguesa) e indígena, de forma que características de origem
africana na cultura brasileira encontram-se em geral mescladas a outras
referências culturais.
Traços fortes da cultura africana podem ser
encontrados hoje em variados aspectos da cultura brasileira, como a música
popular, a religião, a culinária,
o folclore e
as festividades populares. Os estados do Maranhão, Pernambuco,
Alagoas, Bahia, Minas
Gerais, Espírito Santo, Rio
de Janeiro, São Paulo e Rio
Grande do Sul foram os mais influenciados pela cultura de origem africana,
tanto pela quantidade de escravos recebidos durante a época do tráfico como
pela migração interna dos escravos após o fim do ciclo da cana-de-açúcar na região
Nordeste. Ainda que tradicionalmente desvalorizados na
época colonial e no século XIX, os aspectos da cultura brasileira de origem
africana passaram por um processo de revalorização a partir do século XX que
continua até os dias de hoje.
Evolução histórica
De maneira geral, tanto na época colonial como
durante o século XIX a matriz cultural de origem europeia foi a mais valorizada
no Brasil, enquanto que as manifestações culturais afro-brasileiras foram
muitas vezes desprezadas, desestimuladas e até proibidas. Assim, as religiões
afro-brasileiras e a arte marcial da capoeira foram
frequentemente perseguidas pelas autoridades. Por outro lado, algumas
manifestações de origem folclórico, como as congadas, assim
como expressões musicais como o lundu, foram toleradas e até estimuladas.
Entretanto, a partir de meados do século XX, as
expressões culturais afro-brasileiras começaram a ser gradualmente mais aceitas
e admiradas pelas elites brasileiras como expressões artísticas genuinamente
nacionais. Nem todas as manifestações culturais foram aceitas ao mesmo tempo. O
samba foi uma das
primeiras expressões da cultura afro-brasileira a ser admirada quando ocupou
posição de destaque na música popular, no início do século XX. Posteriormente, o governo da ditadura do Estado Novo de Getúlio
Vargas desenvolveu políticas de incentivo do nacionalismo nas quais a
cultura afro-brasileira encontrou caminhos de aceitação oficial. Por exemplo,
os desfiles de escolas de samba ganharam nesta época aprovação
governamental através da União Geral das Escolas de
Samba do Brasil, fundada em 1934.
Outras expressões culturais seguiram o mesmo
caminho. A capoeira,
que era considerada própria de bandidos e marginais, foi apresentada, em 1953, por mestre
Bimba ao presidente Vargas, que então a chamou de "único esporte
verdadeiramente nacional". A partir da década
de 1950 as perseguições às religiões afro-brasileiras diminuíram e
a Umbanda
passou a ser seguida por parte da classe média carioca
. Na década seguinte, as religiões afro-brasileiras passaram a ser celebradas
pela elite intelectual branca. Em 2003, foi promulgada a lei nº 10.639 que alterou a Lei de Diretrizes e
Bases da Educação (LDB), passando-se a exigir que as escolas brasileiras de
ensino fundamental e médio incluam no currículo
o ensino da história e cultura afro-brasileira.
Estudos afro-brasileiros
O interesse pela cultura afro-brasileira
manifesta-se pelos muitos estudos nos campos da sociologia,
antropologia,
etnologia,
música e linguística,
entre outros, centrados na expressão e evolução histórica da cultura
afro-brasileira. Muitos estudiosos brasileiros como o advogado Edison
Carneiro, o médico legista Nina
Rodrigues, o escritor Jorge Amado, o poeta e escritor
mineiro Antonio Olinto, o escritor e jornalista João Ubaldo, o antropólogo
e museólogo
Raul Lody,
entre outros, além de estrangeiros como o sociólogo
francês Roger
Bastide, o fotografo Pierre Verger, a pesquisadora etnóloga estadunidense
Ruth
Landes, o pintor argentino Carybé,
dedicaram-se ao levantamento de dados sobre a cultura afro-brasileira, a qual
ainda não tinha sido estudada em detalhe
.
Alguns infiltraram-se nas religiões afro-brasileiras, como é o
caso de João do Rio, com esse propósito; outros foram
convidados a fazer parte do Candomblé
como membros efetivos, recebendo cargos honorificos como Obá
de Xangô no Ilê Axé Opô Afonjá e Ogan na Casa Branca do Engenho Velho, Terreiro do Gantois, e ajudavam financeiramente
a manter esses Terreiros. Muitos sacerdotes leigos em literatura se
dispuseram a escrever a história das religiões afro-brasileiras, recebendo a
ajuda de acadêmicos simpatizantes ou membros dos candomblés. Outros, por já
possuírem formação acadêmica, tornaram-se escritores paralelamente à função de
sacerdote, como é caso dos antropólogos
Júlio Santana Braga e Vivaldo da Costa Lima, as Iyalorixás
Mãe
Stella e Giselle Cossard, também conhecida como Omindarewa a
francesa, o professor Agenor Miranda, a advogada Cléo
Martins e o professor de sociologia Reginaldo
Prandi, entre outros.
Religião
Os negros trazidos da África como escravos
geralmente eram imediatamente batizados e obrigados a seguir o Catolicismo.
A conversão era apenas superficial e as religiões de origem africana
conseguiram permanecer através de prática secreta ou o sincretismo
com o catolicismo. Algumas religiões afro-brasileiras ainda mantém
quase que totalmente suas raízes africanas, como é o caso das casas
tradicionais de Candomblé e do Xangô do Nordeste; outras formaram-se através do sincretismo religioso, como o Batuque, o Xambá e a Umbanda. Em maior
ou menor grau, as religiões afro-brasileiras mostram influências do Catolicismo
e da encataria europeia, assim como da pajelança
ameríndia
. O sincretismo manifesta-se igualmente na tradição do batismo dos
filhos e o casamento na Igreja
Católica, mesmo quando os fiéis seguem abertamente uma religião afro-brasileira.
Já no Brasil colonial os negros e mulatos,
escravos ou forros, muitas vezes associavam-se em irmandades
religiosas católicas. A Irmandade da Boa Morte e a Irmandade de
Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos foram das mais importantes,
servindo também como ligação entre o catolicismo e as religiões
afro-brasileiras. A própria prática do catolicismo tradicional sofreu
influência africana no culto de santos de origem africana como São
Benedito, Santo Elesbão, Santa
Efigênia e Santo Antônio de Noto (Santo Antônio de Categeró ou Santo Antônio Etíope); no
culto preferencial de santos facilmente associados com os orixás
africanos como São Cosme e Damião (ibejis), São Jorge
(Ogum no Rio
de Janeiro), Santa Bárbara (Iansã); na
criação de novos santos populares como a Escrava Anastácia; e em ladainhas, rezas (como a Trezena de Santo
Antônio) e festas religiosas (como a Lavagem
do Bonfim onde as escadarias da Igreja de Nosso Senhor do Bonfim
em Salvador, Bahia são lavadas com
água de cheiro pelas filhas-de-santo
do candomblé).
As igrejas
pentencostais do Brasil, que combatem as religiões de origem africana, na
realidade têm várias influências destas como se nota em práticas como o batismo
do Espírito Santo e crenças como a de incorporação de entidades espirituais
(vistas como maléficas). Enquanto o Catolicismo
nega a existência de orixás e guias, as igrejas pentencostais acreditam na sua existência,
mas como demônios. Segundo o IBGE, 0,3% dos
brasileiros declaram seguir religiões de origem africana, embora um
número maior de pessoas sigam essas religiões de forma reservada.
Inicialmente desprezadas, as religiões
afro-brasileira foram ou são praticadas abertamente por vários intelectuais e
artistas importantes como Jorge Amado, Dorival
Caymmi, Vinícius de Moraes, Caetano
Veloso, Gilberto Gil, Maria
Bethânia (que freqüentavam o terreiro de Mãe
Menininha), Gal Costa (que foi iniciada para o Orixá Obaluaye), Mestre Didi
(filho da iyalorixá Mãe
Senhora), Antonio Risério, Caribé, Fernando
Coelho, Gilberto Freyre e José
Beniste (que foi iniciado no candomblé
ketu).
Religiões
afro-brasileiras
- Babaçuê - Pará
- Batuque - Rio Grande do Sul
- Cabula - Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Santa Catarina.
- Candomblé - Em todos estados do Brasil
- Culto aos Egungun - Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo
- Culto de Ifá - Bahia, Rio de Janeiro, São Paulo
- Macumba - Rio de Janeiro
- Omoloko - Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo
- Quimbanda - Rio de Janeiro, São Paulo
- Tambor-de-Mina - Maranhão
- Terecô - Maranhão
- Umbanda - Em todos estados do Brasil
- Xambá - Alagoas, Pernambuco
- Xangô do Nordeste - Pernambuco
- Confraria
- Irmandade dos homens pretos
- Sincretismo
Arte
O Alaká africano,
conhecido como pano da costa no Brasil é produzido por tecelãs do
terreiro de Candomblé Ilê Axé Opô Afonjá em Salvador, no espaço chamado
de Casa do Alaká
. Mestre
Didi, Alapini
(sumo sacerdote) do Culto aos Egungun e Assògbá (supremo
sacerdote) do culto de Obaluaiyê e Orixás da terra,
é também escultor
e seu trabalho é voltado inteiramente para a mitologia e arte yorubana.6
Na pintura
foram muitos os pintores e desenhistas que se dedicaram a mostrar a beleza do Candomblé,
Umbanda e Batuque em suas
telas. Um exemplo é o escultor e pintor argentino Carybé que dedicou
boa parte de sua vida no Brasil esculpindo e pintando os Orixás e festas nos
mínimos detalhes, suas esculturas podem ser vistas no Museu Afro-Brasileiro e tem alguns livros
publicados do seu trabalho. Na fotografia o francês Pierre Fatumbi Verger, que em 1946 conheceu a
Bahia e ficou até
o último dia de vida, retratou em preto e branco o povo brasileiro e
todas as nuances do Candomblé, não satisfeito só em fotografar passou a fazer
parte da religião, tanto no Brasil como na África onde
foi iniciado como babalawo, ainda em vida iniciou a Fundação Pierre Verger em Salvador, onde se
encontra todo seu acervo fotográfico.
Culinária
A feijoada brasileira, considerada o prato
nacional do Brasil, é frequentemente citada como tendo sido criada nas senzalas
e ter servido de alimento para os escravos na época colonial. Atualmente,
porém, considera-se a feijoada brasileira uma adaptação tropical da feijoada
portuguesa que não foi servida normalmente aos escravos. Apesar disso, a
cozinha brasileira regional foi muito influenciada pela cozinha africana, mesclada
com elementos culinários europeus e indígenas.
A culinária baiana é a que mais demonstra a
influência africana nos seus pratos típicos como acarajé, caruru, vatapá e moqueca. Estes
pratos são preparados com o azeite-de-dendê,
extraído de uma palmeira africana trazida ao Brasil em tempos coloniais. Na
Bahia existem duas maneiras de se preparar estes pratos "afros".
Numa, mais simples, as comidas não levam muito tempero e são feita nos
terreiros de candomblé para serem oferecidas aos orixás. Na outra
maneira, empregada fora dos terreiros, as comidas são preparadas com muito
tempero e são mais saborosas, sendo vendidas pelas baianas do acarajé e degustadas em restaurantes e
residências.
Música e dança
A música criada pelos afro-brasileiros é uma
mistura de influências de toda a África subsaariana com elementos da música
portuguesa e, em menor grau, ameríndia,
que produziu uma grande variedade de estilos. A música popular brasileira é fortemente
influenciada pelos ritmos africanos. As expressões de música afro-brasileira
mais conhecidas são o samba,
maracatu, ijexá, coco,
jongo, carimbó, lambada, maxixe, maculelê.
Como aconteceu em toda parte do continente
americano onde houve escravos africanos, a música feita pelos afro-descendentes
foi inicialmente desprezada e mantida na marginalidade, até que ganhou
notoriedade no início do século XX e se tornou a mais popular nos dias atuais.
Instrumentos
usados por afro-brasileiros
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