sábado, 26 de abril de 2014

A Super Bactéria



As bactérias KPC ou bactérias super-resistentes a antibióticos são um fenômeno recente observado em pacientes que viajaram ao sul da Ásia para fazerem cirurgias plásticas e retornaram a seus países. O primeiro estudo foi publicado em 2009, na revista médica The Lancet e se refere ao gene NDM-1, encontrado até o momento nas bactérias Klebsiella pneumoniae e Escherichia coli, que causam pneumonia e infecção urinária. Esse gene produz resistência até aos antibióticos da classe das carbapenemas e pode levar a uma preocupante pandemia em futuro próximo.


Segundo os cientistas  da Universidade de Madras, as novas bactérias chegaram à Grã-Bretanha trazidas por pacientes que viajaram à Índia ou ao Paquistão para realizarem tratamentos cosméticos. Ao acompanharem pacientes com sintomas suspeitos, eles encontraram 44 casos (1,5% dos investigados) em Chennai e 26 (8%) em Haryana, na Índia. Eles também detectaram a superbactéria em Bangladesh e no Paquistão, bem como em 37 casos na Grã-Bretanha. Os únicos antibióticos efetivos foram a tigeciclina e a colistina.Os pesquisadores alertam que o gene se instala nos plasmídeos, estruturas de DNA que podem facilmente ser copiadas e transmitidas para diversos outros tipos de bactéria. "Isso sugere uma alarmante possibilidade de o gene se espalhar e modificar toda a população de bactérias", disse ao Correio Braziliense Timothy Walsh, médico descobridor do gene. A mutação foi causada pelo uso excessivo de antibióticos e devido à falta de grandes cuidados higiênicos nos países citados.
 

O gene já foi detectado também na Austrália e em Portugal, onde a notificação compulsória foi instituída em outubro, sempre que a investigação de bactérias resistentes aos carbapenemos revelar a enzima NDM-1. Até o momento, há casos relatados no Brasil, mas as autoridades médicas afirmam que ainda não se classifica a moléstia como Emergência de Saúde Pública de Importância Internacional, classificação definida pelo Regulamento Sanitário Internacional (RSI 2005) para medidas contra novos agentes infecciosos. Autoridades da Índia protestaram contra a insinuação de que o país não é seguro para cirurgias. Por causa do turismo médico e das viagens internacionais, e devido à baixa expectativa de novos antibióticos, a bactéria pode se tornar grave problema de saúde pública no mundo todo.O fenômeno da resistência bacteriana é antigo e decorre de uso indiscriminado de antibióticos e de má higienização nos hospitais. A diferença é que desta vez a resistência chegou ao nível em que nenhum antibiótico surte efeito contra as bactérias. Nas palavras do médico David Livermore, da Agência Britânica para a Proteção de Saúde:
 

Se isto for ignorado, o nosso receio é que a resistência se comece a propagar por outras bactérias no Reino Unido. As bactérias que têm revelado essa resistência são as que normalmente causam infecções urinárias, particularmente em pacientes hospitalizados. Por vezes causam infecções em feridas e outras vezes pneumonias, um vasto leque de infecções que afetam principalmente pessoas mais vulneráveis, que já estejam doentes.Em outubro de 2010, um surto da superbactéria causou a morte de 18 pessoas no Distrito Federal, dentro de um universo de 183 contaminados. Entretanto, não é o mesmo micro-organismo da Ásia, apenas possui a mesma origem no gene mutante da Klebsiella pneumoniae. As autoridades médicas posteriormente reconheceram casos em Paraíba, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul e Paraná. Anunciaram também uma reunião da Anvisa para restringir a venda de antibióticos no Brasil e discutir outros meios de evitar a propagação da superbactéria.
 

O surto de superbactéria no Distrito Federal foi causado sobretudo pela má higiene hospitalar e pela falta de recursos materiais, enfatizando a necessidade de mais verbas para o SUS e a conscientização de médicos e pacientes contra o uso indiscriminado de antibióticos, o que causa seleção bacteriana. Entretanto, o problema ainda se restringe a ambientes hospitalares. O infectologista Alexandre Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia do Distrito Federal, explica o problema da seguinte forma:


quem corre mais risco de infecção são pacientes que estão com sonda, catéter, punção venosa ou em outra situação que possa favorecer a infecção bacteriana. Mas, para quem visita o paciente, o risco é de ser colonizado pela bactéria, algo muito diferente de ser contaminado. Ou seja, a bactéria pode estar presente nas mãos, nos braços e no trato digestivo do visitante que manteve contato com o paciente, mas ele só correrá o risco de contaminação se sua saúde estiver debilitada e ele estiver com a imunidade baixa. Segundo o médico David Uip, diretor do Instituto Emílio Ribas, unidade de referênia em infectologia no Brasil, o custo de desenvolvimento de novos antibióticos é muito elevado e os laboratórios farmacêuticos podem não se interessar, exigindo-se portanto pesados investimentos públicos. Ele afirnou que os infectologistas brasileiros estão se valendo da polimixina para enfrentarem as supebactérias, mas isso poderá causar nova seleção bacteriana. A Sociedade Americana de Doenças Infecciosas estabeleceu como meta, até 2020, colocar dez novos produtos no mercado.
 

Em 2011, uma cepa de Staphylococcus aureus também foi identificada como uma bactéria resistente a todos os antibióticos. A amostra foi colhida no leite de vaca na Escócia, Inglaterra, Dinamarca, Irlanda e Alemanha, mas o mesmo germe se encontra em seres humanos, principalmente na pele. Geralmente o estafilococo só causa doença quando a pessoa se corta e essa variedade não é mais patogênica, mas resiste a qualquer antibiótico, tornando mais difícil o tratamento. Isso se deve a um gene chamado CFR, que codifica uma proteína capaz de proteger o ribossomo da bactéria contra o antibiótico. Entretanto, pode haver uma alternativa. O Hospital das Clínicas de São Paulo investigou o efeito do ozônio em dez bactérias, incluindo a KPC, e concluiu que essa substância pode destrui-las por meio de corrosão de suas membranas. O teste foi feito in vitro, com colônias de bactérias, e deve ser repetido em pacientes de hospitais e UTIs, cujos ambientes podem ser vaporizados com ozônio. Esse gás há tempo vem sendo usado com sucesso em infecções bacterianas.





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