Feijoada é um prato que consiste num
guisado de feijão com carne, normalmente acompanhado com arroz. É um prato com
origem no Norte de Portugal, e que hoje em dia constitui um dos pratos mais
típicos da cozinha brasileira.
Em Portugal, cozinha-se com feijão branco no noroeste (Minho e Douro
Litoral) ou feijão vermelho no nordeste (Trás-os-Montes),
e geralmente inclui também outros vegetais (tomate, cenouras ou couve)
juntamente com a carne de porco ou de vaca, às quais se podem juntar chouriço,
morcela ou farinheira.
No Brasil, é feita da mistura de feijões pretos
e de vários tipos de carne de porco e de boi, e chega à mesa acompanhada de farofa, arroz branco, couve refogada e laranja fatiada,
entre outros ingredientes. Em Portugal, esta versão da feijoada é conhecida como feijoada
à brasileira, sendo também comum encontrá-la nos cardápios dos restaurantes portugueses,
para além das feijoadas portuguesas .
A explicação popular mais difundida sobre a
origem da feijoada é a de que os senhores – das fazendas de café, das minas de
ouro e dos engenhos de açúcar – forneciam aos escravos os
"restos" dos porcos, quando estes eram carneados. O cozimento desses
ingredientes, com feijão e água, teria feito nascer a receita. Tal versão,
contudo, não se sustenta, seja na tradição culinária, seja na mais leve
pesquisa histórica. Segundo Carlos Augusto Ditadi, especialista em assuntos
culturais e historiador do Arquivo
Nacional do Rio de Janeiro, em artigo publicado na revista Gula, de maio de 1998,
essa alegada origem da feijoada não passa de lenda contemporânea, nascida do folclore
moderno, numa visão romanceada das relações sociais e culturais da escravidão
no Brasil.
O padrão alimentar do escravo não difere
fundamentalmente no Brasil do século
XVIII. Continuava tendo como base a farinha de mandioca ou de milho feita com água
e mais alguns complementos, ou seja, o que fora estabelecido desde os
primórdios. A sociedade escravista do Brasil, no século
XVIII e parte do XIX, foi constantemente assolada pela escassez e carestia
dos alimentos básicos, em decorrência da monocultura, da dedicação exclusiva à
mineração e do regime de trabalho escravo, não sendo raros os óbitos por
alimentação deficiente, incluindo a morte dos próprios senhores.
O escravo não podia ser simplesmente maltratado,
pois custava caro e era a base da economia. Devia comer três vezes ao dia.
Geralmente almoçava às 8 horas da manhã, jantava à 1 hora da tarde e ceava por
volta de 8 ou 9 horas da noite. Nas referências históricas sobre o cardápio dos
escravos, constatamos a presença inequívoca do angu de fubá de milho, ou
de farinha de mandioca, além do feijão
temperado com sal e gordura, servido muito ralo e a ocasional aparição de algum
pedaço de carne de vaca ou de porco. Alguma laranja colhida
do pé complementava o resto, o que evitava o escorbuto. Às
vezes, em final de boa colheita de café, o capataz da fazenda podia até dar um
porco inteiro aos escravos. Mas isso era exceção. Não existe nenhuma referência
histórica reconhecida a respeito de uma humilde e pobre feijoada, elaborada no
interior da maioria das tristes e famélicas senzalas.
Existe também um recibo de compra pela Casa
Imperial, de 30 de abril de 1889, em um açougue da cidade de Petrópolis,
Estado do Rio de Janeiro, no qual se vê que consumiam-se carne verde, de
vitela, carneiro, porco, linguiça, linguiça de sangue, fígado, rins, língua, miolos, fressura de boi
e molhos de tripas. O que comprova que não eram só escravos que comiam esses
ingredientes, e que não eram de modo algum "restos". Ao contrário,
eram considerados iguarias. Em 1817, Jean-Baptiste Debret já relata a
regulamentação da profissão de tripeiro, na cidade do Rio de
Janeiro, que eram vendedores ambulantes, e que se abasteciam destas partes dos
animais em matadouros de gado e porcos, Debret também informa que os miolos iam
para os hospitais, e que fígado, coração e tripas (de vaca, bois e porcos) eram
utilizados para fazer o angu,
comumente vendido por escravas de ganho ou forras nas praças e ruas da cidade,
dessa prática surge o que no Rio de Janeiro se denomina de Angu a Baiana,
principalmente porque leva em sua composição o azeite-de-dendê
(azeite-de-palma).
Portanto, a sua criação e nome tem relação com
modos de fazer portugueses, das regiões da Estremadura,
das Beiras e de Trás-os-Montes e Alto Douro, que
misturam feijão de vários tipos - menos o feijão preto
(de origem americana) - linguiças, orelhas e pé de porco. De fato, os cozidos são comuns
na Europa, como o cassoulet francês, que também leva feijão no seu preparo.
Na Espanha, o cozido madrilenho e a fabada asturiana e, na Itália, a
“casseruola” ou "casserola" milanesa são preparados com grão-de-bico.
Aparentemente, todos estes pratos tiveram evolução semelhante à da feijoada,
que foi incrementada com o passar do tempo, até se transformar no prato da
atualidade. Câmara Cascudo observou que sua fórmula continua em
desenvolvimento.
A feijoada já parece ser bem conhecida no início
do século XIX, como atesta um anúncio, publicado no Diario de Pernambuco, na cidade do Recife, de 7 de
agosto de 1833, no qual um restaurante, o Hotel Théâtre, recém-inaugurado,
informa que às quintas-feiras seria servida "feijoada à brasileira".
Em 3
de março de 1840,
no mesmo jornal, o Padre Carapuceiro publicava um artigo, no qual
dizia:
"Nas
famílias onde se desconhece a verdadeira gastronomia, onde se tomam
regabofes, é prática usual e comezinha converter em feijoada os fragmentos do
jantar da véspera, ao que chamam enterro dos ossos [...] Lançam-se em uma
grande panela ou caldeirão restos de perus, de leitões assados, fatacões de
toucinho e de presunto, além disto bons vassalhos de carne seca vulgo ceará,
tudo vai de mistura com o indispensável feijão: fica tudo reduzido a uma
graxa!"
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Em 1848, o mesmo Diário de Pernambuco já anunciava
a venda de "carne de toucinho, própria para feijoadas, a 80 réis a
libra". No dia 6 de janeiro de 1849, no Jornal do Commercio, do Rio de Janeiro, é
comunicado que a recém instalada casa de pasto "Novo Café do
Commércio", junto ao botequim da "Fama do Café com Leite",
servirá em todas as terças e quintas-feiras, a pedido de muitos fregueses,
"A Bella Feijoada à Brazilleira".
A feijoada completa, tal como a conhecemos,
acompanhada de arroz branco, laranja em fatias, couve refogada e farofa, era muito afamada
no restaurante
carioca G. Lobo,
que funcionava na rua General Câmara, 135, no centro da cidade do Rio
de Janeiro. O estabelecimento, fundado no final do século XIX, desapareceu
em 1905, com as obras de alargamento da rua Uruguaiana. Com a construção da
avenida Presidente Vargas, na década de 1940, esta rua desaparece por
definitivo.
Nos livros Baú de Ossos e Chão de Ferro, Pedro Nava
descreve a feijoada do G. Lobo, elogiando aquela preparada pelo Mestre Lobo.
Sobretudo, revela-se na presença do feijão-preto, uma predileção carioca. A
receita contemporânea teria migrado da cozinha do estabelecimento G. Lobo para
outros restaurantes da cidade, bem como para São Paulo,
Minas
Gerais e Bahia.
Bares e botequins das grandes cidades do Centro-Leste também a adotaram com
sucesso. Mas ressalva Pedro Nava que é (...) "antes a evolução venerável
de pratos latinos".
"No meu
Baú de Ossos referi, repetindo Noronha Santos, que a feijoada completa é
prato legitimamente carioca. Foi inventado na velha Rua General Câmara, no
restaurante famoso de G. Lobo, cujo nome se dizia contraído em Globo. Grifei,
agora, o inventado, para marcar bem marcado seu significado de achado.
Não se pode dizer que ele tenha sido criação espontânea. É antes a evolução
venerável de pratos latinos como o cassoulet francês que é um ragout
de feijão-branco com carne de ganso, de pato ou de carneiro – que pede a
panela de grés – cassole – para ser preparado."
|
— Pedro
Nava em Chão de Ferro.
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A feijoada de qualquer forma, se popularizou entre
todas as camadas sociais no Brasil, sempre com espírito de festa e celebração,
longe de rememorar escassez. Ficaram famosas na lembrança, aquelas preparadas
no final do século XIX e início do XX, na cidade do Rio
de Janeiro, pela baiana Tia Ciata.
E anteriormente, o escritor Joaquim José de França Júnior, em texto de 1867, descreve
ficticiamente um piquenique no campo da Cadeia Velha, onde é servida uma
feijoada com "(...) Lombo, cabeça de porco, tripas,
mocotós, língua do Rio Grande, presunto, carne-seca, paio, toucinho,
linguiças (...) ", e, em 1878, descreve uma "Feijoada em
[Paquetá]", onde diz que: " (...) A palavra – feijoada, cuja origem
perde-se na noite dos tempos d’El-Rei Nosso Senhor, nem sempre designa a mesma
coisa. Na acepção comum, feijoada é a iguaria apetitosa e suculenta dos nossos
antepassados, baluarte da mesa do pobre, capricho efêmero do banquete do rico,
o prato essencialmente nacional, como o teatro do Pena, e o sabiá das sentidas
endeixas de Gonçalves Dias. No sentido figurado, aquele vocábulo designa a
patuscada, isto é, "uma função entre amigos feita em lugar remoto ou pouco
patente" (...)".
Atualmente, espalha-se por todo o território
nacional, como a receita mais representativa da cozinha brasileira. Revista,
ampliada e enriquecida, a feijoada deixou de ser exclusivamente um prato. Hoje,
como também notou Câmara Cascudo, é uma refeição completa.
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